13 de out de 2021

Características nutricionais e uso de subproduto na alimentação de bovinos

Subproduto da indústria de fecularia

O processamento da mandioca envolve a fabricação de farinha e a extração do amido, também chamado de fécula. Estes processos resultam em uma variedade de resíduos sólidos, como as cascas, descartes e bagaços, ou resíduos líquidos, como a manipueira e a água da lavagem da raiz.

Quando lançados no meio ambiente podem causar problemas sérios de poluição, pois além da sua elevada carga orgânica, apresenta um composto que pode gerar cianeto, composto tóxico para a maioria dos seres de respiração aeróbia. Com isto, alternativas como a utilização destes subprodutos na alimentação animal, adubação, biofertilizantes e etc., vêm sendo utilizadas com o objetivo de minimizar o impacto ambiental negativo.

Processo de obtenção dos subprodutos

No processo de industrialização da mandioca predomina a fabricação da farinha de mesa e a extração de fécula, gerando resíduos sólidos ou líquidos.

Os resíduos líquidos são constituídos pela água oriunda do processo de lavagem das raízes, a manipueira, que vem a ser a água de constituição da raiz, extraída da prensagem da massa ralada, na confecção da farinha e também pela água de extração da fécula da mandioca.

Estes resíduos têm composição variável, porém com alto potencial poluente devido ao elevado teor de material orgânico. Os resíduos sólidos do processamento das raízes (casca, raspa, farelo de varredura e parte aérea), são de interesse na alimentação de bovinos, sendo caracterizados a seguir.

Devido a grande quantidade de água utilizada durante o processamento da mandioca, os seus subprodutos apresentam umidade bastante elevada, sendo necessária realização de secagem para que se possam atingir maiores valores de matéria seca.

Este processo de secagem pode ser por meio artificial com auxílio de estufas, ou natural por secagem ao sol. Esta prática se torna necessária por facilitar o armazenamento e a conservação do material.

Composição bromatológica

A composição nutricional dos resíduos da mandioca é muito variável. Por isso incluiremos neste trabalho somente aqueles de maior volume e que apresentam composição mais homogênea. A mandioca e seus subprodutos na alimentação animal representam excelentes fontes energéticas, que podem substituir o milho na alimentação de ruminantes, principalmente devido a constante oscilação nos preços deste produto.

Na alimentação animal, a mandioca pode ser fornecida nas mais variadas formas: raízes frescas, restos culturais (hastes e folhas) e subprodutos sólidos (cascas, entrecascas, descartes e farelos). Apesar de apresentar grande potencial como alimento energético para bovinos, a mandioca é pouco utilizada como componente na produção de rações. Além da possibilidade de utilização da raiz de mandioca em forma de raspa, existem vários resíduos oriundos da industrialização que também podem ser utilizados na alimentação animal (Souza & Boin, 2002).

O valor energético da farinha de mandioca para bovinos assemelha-se ao do milho, o que faz da mandioca e seus subprodutos fontes em potencial para substituição do cereal em dietas para ruminantes.

Parte aérea

A parte aérea da mandioca corresponde a aproximadamente 50% do peso total da planta, sendo constituída pelas folhas, hastes e pecíolos, com valor médio de proteína de 16%.

Cerca de 20% da parte aérea da mandioca é utilizada para o replantio, desta forma recomenda-se que para a alimentação seja fornecido o terço superior da planta, deixando a parte mais grossa e lenhosa para a multiplicação. Plantas mais velha, assim como nas gramíneas forrageiras, tendem a apresentar menores valores de proteína e maiores teores de fibra, e, conseqüentemente, menores coeficientes de digestibilidade.

Isto se deve principalmente à menor proporção de folhas em relação ao caule. Ou seja, a maior proporção de folhas melhora a qualidade nutricional, pois os valores médios de proteína e fibra são de 25 e 9% respectivamente, enquanto que do caule é 11% e 25%, respectivamente.

Além do elevado valor energético da parte aérea da mandioca devido ao amido, as folhas apresentam considerável teor de extrato etéreo, entre 5% e 7% MS.

A proteína também se caracteriza pelo elevado conteúdo de lisina (7,2g /100g de proteína), porém os valores de metionina são baixos (1,7g/100g de proteína) em relação às exigências de ruminantes.

O conteúdo de aminoácidos essenciais, de forma geral é igual ou até maior que nas leguminosas. Os minerais de principal contribuição são o cálcio e o fósforo.

Casca da mandioca

Segundo Marques et al. (2000) a casca de mandioca apresenta elevados teores de FDN e FDA, e baixo teor de amido, por ser formada principalmente por elementos estruturais.

Apesar destas características, Martins et al. (2000), ao compararem casca de mandioca e milho como diferentes fontes energéticas, associadas ao farelo de algodão ou levedura para novilhas de corte observaram maior digestibilidade dos nutrientes da casca em relação ao milho.

Farelo de raspas

As raspas são compostas do material proveniente da operação de seleção das raízes, basicamente raiz integral, ou seja, polpa e casca.

Este material é obtido através da picagem e desidratação ao sol ou em estufa, e quando desintegrada transforma-se em farelo de raspas, apresentando teores intermediários de FDN e FDA, e amido.

Farinha de varredura

A farinha de varredura é obtida no processo de industrialização para obtenção do amido, da farinha de mesa e da farinha de raspas, sendo constituída de todo o material perdido no chão e juntado ao resíduo do lavador, sendo seco e moído.

Pode apresentar coloração escura devido à presença de terra. Estima-se que cerca de 3 a 5% da  mandioca utilizada na fabricação da farinha seja eliminada na forma de farinha de varredura

Farelo de bagaço

O farelo de bagaço da mandioca é um resíduo sólido originado do processo de extração da fécula, composto por material fibroso de raiz, contendo parte do amido que não foi extraído no processamento físico. É um resíduo grosseiro, obtido após a segunda peneiragem podendo ser seco ao sol em seguida.

O bagaço da mandioca pode representar entre 10 a 20% do peso das raízes utilizadas para produção de fécula, e seu conteúdo de amido chega a 60%. Na forma úmida o subproduto apresenta cerca de 75% de umidade, pois para extração da fécula é utilizado grande volume de água.

Fatores limitantes para a nutrição

A mandioca apresenta dois compostos químicos, os glicosídeos linamarina e lotaustralina, que geram o ácido cianídrico (HCN), cujos efeitos tóxicos podem resultar em danos neurológicos crônicos, ou até mesmo a morte.

Sugere-se que o HCN afeta os animais pela afinidade com o ferro (Fe), desta forma interagindo com a hemoglobina para formar a ciano-hemoglobina, impedindo assim o transporte de oxigênio para os tecidos, levando o animal a asfixia.

A dose letal considerada por Oke (1964) citado por Pedroso et al. (2006), é de 1mg/kg de peso vivo. Este limite originou a classificação da mandioca em relação a sua toxidez, que é dependente do conteúdo de HCN.

A raiz da mandioca ainda é comumente classificada como raiz mansa e brava, e ainda podem-se citar as doces que quase não apresentam os precursores do composto.

• Não tóxicas: menos de 50mg de HCN/kg de raízes frescas.
• Pouco tóxicas: de 50 a 80mg de HCN/kg de raízes frescas.
• Tóxicas: de 80 a 100 mg de HCN/kg de raízes frescas.
• Muito tóxicas: mais de 100mg de HCN/kg de raízes frescas.

Os compostos cianogênicos estão distribuídos de forma não uniforme em toda a planta, tanto na parte aérea com na subterrânea. As folhas apresentam as maiores concentrações, enquanto que nas raízes, o córtex ou casca grossa, encerra maiores  concentrações que a polpa.

A concentração de HCN varia com a idade da planta, sendo que as mais novas são mais tóxicas, bem como as características do ambiente, solo, clima, etc. As eliminações totais ou parciais do conteúdo de HCN da mandioca e de seus subprodutos podem ser feitos por diversos procedimentos, comuns no processo de industrialização, como a desidratação artificial com temperaturas superiores a 40ªC, a cocção em água, desidratação por radiação solar.

Quando o material é submetido a desidratação, atingindo 10-15% de umidade, o ácido cianídrico é volatilizado. Segundo Souza & Boin (2002), o método mais comum de liberação do HCN é deixar que as enzimas endógenas promovam a liberação do HCN após a maceração da raiz.

O aquecimento (sol ou forno) e o tempo de exposição ao ar também favorecem a liberação, embora tenha sido observado que partes aéreas de mandioca perdem HCN mais rapidamente quando secas a sombra. A extrusão proporciona total destoxificação, com hidrólise parcial do amido. A intoxicação de animais com HCN somente poderá ocorrer com o fornecimento de raízes frescas, trituradas e fornecidas aos animais imediatamente após a colheita.

O armazenamento por 24-48 horas já eliminaria esse problema. Em função de seus elevados teores de carboidrato e água, a raiz de mandioca é altamente perecível, tornando-se inadequada ao consumo 2-3 dias após a colheita. Esse problema pode ser eliminado transformando as raízes em raspas que poderão ser armazenadas sem problemas.

Segundo Silva et al. (2005), os resíduos da mandioca utilizados na alimentação animal, possuem limitações em relação à baixa padronização da composição bromatológica, ocasionado pela ausência de tecnologia na indústria processadora, acompanhada por uma baixa qualidade sanitária.

Consumo de matéria seca (MS) e níveis de substituição

As informações com base em trabalhos científicos sobre a utilização de resíduos da mandioca na alimentação de bovinos são escassas. Porém, as informações existentes demonstram que o uso destes produtos na bovinocultura é viável, em vista da possibilidade da substituição de alimentos nobres, como o milho na formulação das dietas. 

Animais ruminantes, de forma geral, têm boa aceitação da parte aérea da mandioca, na forma fresca, ensilada ou fenada. Tratando-se apenas de parte aérea, aconselha-se misturá-la com 50% de outros volumosos. É importante lembrar que a introdução desse material na dieta do animal deve ser feita aos poucos, até que o animal se “adapte” a esse novo alimento. Trabalhos sumarizados por Buitagro (1990) indicam que a utilização de parte aérea da mandioca na alimentação de bovinos em crescimento melhorou os ganhos de peso, e a eficiência alimentar. 

A substituição do capim elefante por forragens da parte aérea da mandioca em 25 e 50%, para novilhos zebus confinados, propiciou ganhos 48 e 41% respectivamente maiores que as dietas em que o volumoso era composto apenas de capim elefante. A adição de feno da parte aérea da mandioca em substituição a palha de arroz em 25%, aumentou do teor de proteína bruta da dieta de 4,8% para 6,5% melhorando significativamente a digestibilidade da palha de arroz. 

Porém, acima deste nível, com o aumento de 8,4 para 16,1% no teor de lignina, não houve acréscimo, nem na digestibilidade, nem no consumo de matéria seca, sendo que a digestibilidade da fibra diminuiu. Isto indica que a parte aérea da mandioca, apesar de elevar os teores de proteína na dieta, pode prejudicar a digestibilidade e o consumo dos alimentos, devido ao aumento do teor de lignina. Dietas com 100% de feno de mandioca podem afetar a digestibilidade da fibra, bem como diminuir o consumo de matéria seca. 

Revista Eletrônica Nutritime, v.5, n° 2, p.512-536, Março/Abril 2008. 
Cristiane De Cássia Meneghetti
José Luiz Domingues
Foto: Confinamento São Lucas
http://nutritime.com.br/arquivos_internos/artigosBK/052V5N2P512_536_MAR2008.pdf

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